A
luta constante por um lugar ao sol acabara por me deixar exausto. Encontrava-me
esgotado de toda a vontade, todo desejo de vida que pudesse ter. Meu caminho
solitário já era um companheiro por demais rabugento, minhas pequenas posses
eram fardos pesados demais para ombros cansados de suportar o peso da
indiferença.
Não
sei dizer por quanto tempo fiquei nessa condição. Não saberia afirmar se saí
realmente dela. O que sei é que a tristeza enfadonha de minha rotina me
impregnou de tal forma que eu já não sabia onde iniciava meu eu e o fedor da
minha alma. Ambos eram a mesma coisa, talvez.
Como
se fazer notar em meio a tantas pessoas comuns como eu? Como saber diferenciar
o que eu tinha de diferente daqueles outros? Nada em minha vida me preparou
para esse tipo de avaliação, nada podia me responder esses questionamentos.
Hoje sei. Eu era um pobre, ordinário, burro e com mau gosto.
Não
soube agir como devia; não soube dizer o que precisava ser dito; não soube
calar na hora certa; não soube estender a mão e nem pedir perdão; fui rude e
violento desnecessariamente; abri mão de pessoas que gostava por não saber
expressar meus sentimentos. Enfim, vivi uma vida comum. Como todo bom homem de
família.
Mas
chega uma hora em que tudo cansa, talvez por perceber que as coisas se repetem,
ou por adquirir discernimento e esperteza. A experiência nos traz certos
conhecimentos que não gostaríamos de ter, mas que nos fazem pensar sobre a
vida. Ao fazer isso fiquei deprimido, enjoado. Passei dias ruins, me sentindo
mal.
Busquei
as respostas às perguntas que me assombravam, me surpreendendo com as soluções.
Poderia ter parado por ali, me contentando em saber um pouco mais, matando
aquela curiosidade. No entanto, algo me deixou inquieto, arredio.
Não
bastava mais comer um churrasco, tomar umas cervejas, ouvir meu pagode
preferido e jogar um futebol com os amigos. Isso ainda não me deixava feliz,
completo. A tristeza veio e com ela uma vontade de ser diferente, de tentar
coisas diferentes. Pensei que estava doente, estressado ou algo assim. Depois
de consultas no psiquiatra do posto de saúde, depois de conversar com amigos,
parentes e pessoas mais velhas eu sabia o que devia fazer: ignorar a todos e
buscar fazer o que eu nunca pude.
Pensei
em começar por pequenas coisas. Mudei a marca de xampu. Parei de olhar os
mesmos programas de televisão; comecei a ler o jornal inteiro e não apenas as
sessões de esportes, policial e variedades; procurei andar por lugares que não
conhecia em minha cidade; pratiquei dança, musculação e curso de pintura numa
ONG da comunidade; saí para conhecer pessoas, conversar e aprender.
Com
esforço, voltei a estudar para terminar o ensino básico. Quando vi que não foi
tão difícil, me animei a tentar o Ensino Médio. Consegui uma vaga, estudava à
noite e me dediquei bastante para concluir tudo num supletivo. Aprendi a ler
com mais calma, saboreando os textos.
Quando
percebi tinham-se passado alguns anos. Minha vida mudara, meus filhos cresceram
fortes, saudáveis, boas pessoas; meu mundo se expandira, minha alma se
purificou graças aos meus esforços. E eu estava mais confiante, corajoso com
relação ao desconhecido da vida. Perdi amigos, pessoas que não puderam ou não
quiseram me acompanhar; feri outros, magoei uns tantos. E nisso tudo, pude entender
muitas coisas.
Por
que é tão difícil fazer isso quando temos tempo e condições para tal? Na
infância somos tolhidos por nossos impacientes pais, incapazes de responder a
tantas questões de seus filhos. Ou porque realmente não sabem o que dizer... Na adolescência somos rotulados de rebeldes,
de inconformados e qualquer pergunta já é vista como um sintoma de transgressão.
Leve-se em conta que muitas vezes um adolescente nem sabe formular a pergunta
que o incomoda. E quando adultos? Somente com muita força de vontade e algum
sentimento muito forte de descontentamento é que se pode mudar.
Eu
me fiz notar, para os outros e para eu mesmo, de forma a ser reconhecido como
um ser humano, uma pessoa, um indivíduo. E isso é a maior conquista que podemos
nos dar. Agir, buscar, aprender; depois usar do que se sabe, ser responsável
por isso tudo, por esse mundo que temos em comum.
Tu estava era com fome sor.
ResponderExcluirkkkkkk.
ResponderExcluirConcordo que somente somos obrigados a mudar quando sentimos condições extremas. Isto vem da falta de equilíbrio, nossa inesgotável fonte de problemas. Razão de nossa moral imoral e nossa ética metida a absoluta.