04 maio, 2011

Considerações Sobre o Problema da Verdade

     Ao avaliar o conceito de verdade se faz necessário primeiro definir com clareza o que pretendemos investigar, sob pena de confundir perspectivas e abordagens. A verdade como objeto de estudo tem um primeiro aspecto lingüístico-analítico, num processo de investigação lógico e argumentativo; já o segundo aspecto básico é o do conceito cosmológico, visando entender e procurar uma verdade ontológica, existente no mundo real, tendo uma abordagem mais metafísica de análise.


     Em ambos os casos não se pode chegar ainda a uma verdade de fato, mas postula-se que as aproximações que fazemos pela razão, pela lógica, pela linguagem e pelas idéias sejam ao menos as mais próximas possíveis da verdade pretendida, ou aspirada.

     Mesmo numa análise metafísica, onde atua estritamente a razão, independente de apoio formal, empírico, ainda devemos apoiar argumentos e teorias numa base sólida da lógica ou de argumentos lógicos, justificados.

     A pretensão de verdade significa que procuro aquele elemento básico capaz de passar confiança total naquilo que se afirma. Nesse sentido a verdade seria a comprovação de um pressuposto lógico do conhecimento e da linguagem: aquilo que é enunciado busca ser também verdadeiro; aquilo que é, é verdadeiro. Busca-se a total confiança de que o que aprendemos ou conhecemos é verdadeiro, é um saber que se faz real, certo, inquestionável.

     No entanto, existe a não-verdade, a mentira. Podemos dizer que isso tem a ver estritamente com o entendimento humano, a linguagem e interação humanas permitem a mentira, inclusive necessitam dela. A verdade seria por esse prisma, subjetiva: relativa ao sujeito que exprime uma idéia, um conceito ou uma ação, ela não teria como garantia nada além da boa fé na sociedade e nas outras mentes pensantes que transmitem informações.

     As coisas naturais, como desastres climáticos, leis da física e biologia e outros, seriam efetivos apenas numa dimensão não pensada pelo homem? Ou ao serem pensadas poderiam ser manipuladas, mal interpretadas, esquecidas? Teríamos aqui também a possibilidade de mentira, de não-verdade, seja por intenção, não compreensão ou inépcia. Mas há um erro. Ainda teríamos essa compreensão por uma perspectiva humana, não pela verdade existente.

     A verdade em si existe na natureza? Essas leis físicas que se descobrem, que se aprofundam pela ciência sempre foram dessa maneira? Será que a verdade não muda com o passar dos anos e com o avanço do conhecimento humano acerca de seu mundo?

     Esses questionamentos antigos exprimem certas angústias humanas que permaneceram ao longo dos séculos sem resposta concreta, além de postulações filosóficas que tentam esclarecer o assunto. Na abordagem analítica a verdade passa pelo enunciado de uma proposição, sendo que seu significado tem que fazer sentido para quem compreende o mesmo. A verdade será o sentido preservado, independente das palavras e da proposição, desde que se mantenha a coerência e a estrutura lógica, argumentativa. Particularmente, vejo esse tipo de análise como algo muito restritivo para tentar abordar algo tão básico e importante como a verdade. Esse conceito foi pressuposto em todas as ciências e discutidos em filosofia desde seu surgimento; um ramo específico e metódico como é hoje a epistemologia, não dará conta de explicar o termo, apenas vai limitar o conceito ao seu escopo e talvez unifique um conceito para ser usado em suas avaliações.

     A busca pela verdade, como objeto ontológico ou cosmológico, move pensamentos e sistemas que a muito pensam o mundo por diversas abordagens, sempre visando atingir aspectos antes não alcançados.

     A aproximação do conceito pelo Perspectivismo de Nietzsche oferece uma possibilidade de compreensão um pouco mais abrangente. Justamente por ser o mundo uma série de eventos externos à mente humana, ou ao seu corpo, não há como o home alcançar uma compreensão diferente daquela alcançada pelos órgãos dos sentidos (ainda que num primeiro momento). Mesmo idéias estritamente mentais, foram originadas de evoluções de pensamentos que acompanharam uma progressão de sensações, agora sendo uma parte de um processo diferente do empírico. Cada idéia que o homem se propõe, cada conhecimento que tenta obter, cada informação que recebe, a todas elas tenta uma compreensão de verdade subjetiva e perspectiva, baseada em seus conhecimentos anteriores, suas experiências.

     E mesmo quando tenta isolá-las parte para uma perspectiva: a que não é sua própria. Desse modo, não há como ser objetivo, como obter a verdade. Se ser objetivo é isolar um objeto, um conhecimento ou uma informação de todas as perspectivas e influências que poderiam atrapalhar sua completa compreensão, ainda assim assume-se uma única e final perspectiva, ainda há um “olho que vê”. Para Nietzsche a objetividade está justamente no contrário: ser objetivo é ver uma coisa por todos os ângulos e perspectivas possíveis. Para a compreensão humana isso também é inalcançável, uma vez que não temos condições de entender algo por todas as formas que se apresenta, nem como postular um conhecimento sem a garantia de que seja sua forma final e completa.

     Em resumo, a verdade é algo inalcançável, afastada do nível de compreensão humana, justamente por depender de uma perspectiva do homem para lhe dar sentido e lógica. Ela sofre influência do meio, das experiências e dos conhecimentos anteriores do sujeito cognoscente. Assim, o homem determina suas verdades por suas condições.

     Ela, portanto, é variável com o tempo histórico, a cultura. Ela vai ser determinada e alcançada como uma explicação naquele contexto específico de sua investigação, por conter sempre no método avaliativo os pressupostos não explicitados do sujeito. Não há verdade em si, não há uma verdade lógica independente de um sentido, de um entendimento humano.

     Talvez a única verdade realmente possível de ser alcançada é a de que somos incapazes de obter a Verdade.

Um comentário:

  1. Olá, Alex.

    Considero significativa a condução da problematização da verdade no seu texto.

    Com efeito, parece que a Epistemologia contemporânea provoca uma redução do conceito de verdade a enunciados e proposições, ou seja, "diminui o escopo da verdade".

    Por outro lado, a questão da verdade ontológica nos inquieta. Embora seja intrincado pensar na verdade como a totalidade, o que foi pretensão da Metafísica.

    E a contribuição de Nietzsche ao problema não pode ser preterido. Em "sobre a Verdade e a Mentira num sentido extra-moral", Nietzsche identifica a verdade como uma engenhosa estrutura de metáforas, metonímias, etc.

    Parabéns pela exposição do problema e sua respectiva análise.

    Grande abraço.

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